Ao contrário da face ocidental – que é mais auto-orientada e individualista – a face chinesa é mais orientada para os outros e relacional. Em outras palavras é menos sobre o seu próprio orgulho pessoal ou ego, e mais sobre como se é visto por outros. Ao contrário da face ocidental, a face chinesa pode ser dada ou ganhada. Pode também ser retirada ou perdida.

Em geral as culturas ocidentais tendem a se concentrar no indivíduo como uma organização independente, auto-suficientes. Na educação dos filhos o foco está em ajudá-los a desenvolver um forte senso de integridade pessoal e individualidade (a falta de auto-estima é freqüentemente apontada como mau comportamento).

Em contraste, por cerca de 4.000 anos tem minimizado o conceito de indivíduo e enfatizado a supremacia da família e de grupo. Tudo se resumia a trazer honra ao seu clã. Com a ênfase no coletivo, o senso de individuo é tão subjugado que praticamente não existia. Na verdade o individualismo era visto como imoral.

Sem entrar em categorias sociológicas, basta dizer que este fenômeno social da face tem muito a ver com os ensinamentos de Confúcio. Ele ensinou que se as pessoas fossem conduzidas com excelência e ensinadas a se colocar em seus devidos lugares por meio de práticas e papéis sociais, além de desenvolverem um sentimento de vergonha, eles se auto-ordenariam de forma harmoniosa.

Aqui percebemos que o outro lado de ganhar honra e respeito é evitar a vergonha. Por milhares de anos a China desenvolveu uma cultura baseada na vergonha contrastando com as outras culturas ocidentais, que são mais uma questão de consciência ou de culpa. De um modo geral os chineses se comportam adequadamente, geralmente para evitar a vergonha e o medo de perder a face não necessariamente está ligado ao fato de se sentirem mal com as próprias ações. Para muitos, vale tudo… Desde que não sejam pegos.

A vergonha neste sentido não é apenas algo puramente pessoal – novamente é algo baseado na sua rede de relacionamentos que atua como uma forma de controle social. Qualquer forma de vergonha originada da família, no clã ou de parentesco é encoberta. Totalmente diferente dos ocidentais, onde lavar a roupa suja de sua família em redes de televisão ao vivo é visto como socialmente aceitável.

Por outro lado, as culturas ocidentais se baseiam em termos de verdade e retidão (ser inocente e direito é o mais importante). Os ocidentais são ensinados a respeitar os fatos e objetividade. As leis teoricamente se aplicam igualmente a todos e nosso comportamento é algo que deve ser dirigido e regulado por nossas próprias consciências.

O sentimento ocidental de honra ou a sua face está intimamente ligado a sua integridade pessoal. Nós tendemos a admirar a integridade daqueles que enfrentam intransigentemente a verdade objetiva dos fatos, independente das conseqüências prejudiciais que podem acarretar. Perdoamos àqueles que assumem a responsabilidade de seus erros, desculpam-se e aprendem honestamente com os erros do passado.

Baseando-se nas relações pessoais, as regras e as leis estabelecidas na China eram freqüentemente utilizadas para servir quem estivesse no poder (muitas vezes arbitrárias e em constantes mudanças). Para complicar as coisas, os ensinamentos de Confúcio diziam que você deveria tratar as pessoas de forma diferente dependendo do seu status.

Como resultado a ética chinesa nunca esteve baseada em princípios universais, tais como o bem e o mal. Em vez disto, eles baseiam-se mais nas circunstâncias do momento – sistema este que o Ocidente denomina de “ética situacional” (para grande desgosto das pessoas que realizam negócios com a China).

Da mesma forma o conceito chinês da verdade não é preto ou branco também. A ênfase está menos ligada a sempre dizer a verdade objetivamente, e mais no que a situação e o relacionamento demandam.

Tais diferenças auxiliam a explicar as diferenças culturais sobre o ato de mentir. Os chineses sempre farão de tudo para não perder a face (a sua própria ou a dos outros). Na verdade é perfeitamente compreensível dizer uma mentira, mesmo uma deslavada para proteger a face. A cultura chinesa não pensa na mentira em termos de certo ou errado. O objetivo da verdade chinesa sempre estará direcionado a proteger a face de um indivíduo, do grupo ou mesmo da Nação. Nestas situações, ambas as partes conseguem pelo hábito cultural ler nas entrelinhas e saber diferenciar quando a “verdade está sendo re-embalada” para ajudar a preservar a face (e eles infelizmente, assumem que os ocidentais saberão fazer o mesmo).

Por exemplo, um recepcionista de um hotel poderá lhe dizer uma mentira óbvia informando que eles não possuem mais vagas. Isto pode ser a forma encontrada por ele para salvar a própria face para não ter que lhe dizer que o hotel restringe o acesso a estrangeiros. Como ocidentais temos uma grande dificuldade em lidar com este tipo de situação. Primeiramente porque uma mentira para o ocidental sempre será uma mentira e não toleramos que nos façam passar por tolos. Nossa primeira reação mesmo que não seja um confronto aberto é demonstrar ao mentiroso que ele foi pego, o que pode resultar em uma negação seguida de uma ignorância fingida.

Neste sentido, recomendamos não colocar os chineses (ou qualquer pessoa) contra a parede, caso os pegue em uma mentira (o que seria visto como muito rude ou até cruel). Sempre é uma boa ideia deixar uma saída para qualquer situação de potencial perda de face. Em vez disto, se algo der errado sempre converse em particular. Tente evitar atribuir culpas e utilize a voz passiva: “Parece que existe um problema”. A lisonja também é muito eficaz: “Eu sei que isto não é a sua culpa, mas já que você é uma pessoa muito inteligente, o que você acha que podemos fazer?”